Sugestão de Leitura | Liderar com mundo. Entre estradas e estratégias

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Published on July 29, 2025

Liderar com mundo. Entre estradas e estratégias

Por Rita Romão, PWN Lisbon Board Member e directora de Marketing, Projectos & Parcerias da Fundação EDP.

Cada viagem é um projecto. Tenho uma folha de Excel para quase todas as viagens, onde anoto hotéis, percursos, locais importantes, referências, livros a ler… No fim, registo tudo num grande livro com fotografias, anotações e os percursos percorridos, organizados cronologicamente para memória futura, e que faço questão de imprimir. Obsessiva? Não. Apenas gosto desta rotina, pré e pós-viagem. Da preparação cuidadosa, sabendo que a realidade, por muito estudada que seja, é sempre muito mais rica, diversa e, por isso mesmo, surpreendente!


E, tal como ditam as boas práticas da liderança, também eu faço uso de estratégias, capacidade de síntese e uma boa dose de inspiração nestas andanças.

Sabendo que os manuais corporativos identificam consensualmente sete características que os bons líderes tendem a evidenciar, partilho os meus momentos de eleição:

 

Integridade – Polónia, Março 2022
Tudo preparado para ir de férias para a Tunísia, mas o mundo muda. E nós também. Embarcámos numa comitiva para Varsóvia, de onde trouxemos 22 refugiados que nos confiaram documentos, histórias e a vida. Não é um acto heróico, mas a certeza de que a promessa feita a cada um – nova casa, novo trabalho, novas escolas – seria cumprida. E foi.

 

Empatia – Índia, Junho 2022
Punjab, um bom amigo de uma boa amiga, Sete características dos bons líderes, em lições de viagens.

Rita Romão Board member da PWN Lisbon e directora de Marketing, Projectos & Parcerias da Fundação EDP disponibilizou-se para me levar ao maior mercado de Nova Deli e escolheu, de entre todas as bancas de comida de rua, as iguarias para eu provar o melhor da gastronomia local. As boas práticas de todos os ocidentais ditam que não devemos comer nem beber comida de rua na Índia… Que fazer? Prova-se e agradece-se, já que Punjab estava genuinamente a oferecer-nos o melhor que tinha. As convicções ocidentais ficam na gaveta para melhores dias, porque a simpatia retribui-se na mesma moeda!

 

Autoconhecimento – Lisboa-Dacar off-road, Dezembro 2024
“When the going gets tough, the tough get going.” Ao terceiro dia sem conseguir ler o roadbook, a falhar os prazos de chegada e sem o hotel da praxe com cama feita à espera, o mau feitio instala-se. É preciso parar, reflectir e ter a capacidade introspectiva suficiente para perceber o que estou a fazer mal e como vou dar a volta à questão. E os resultados aparecem: cheguei ao fim do percurso sem acidentes e o meu carro passou a constar nos rankings de chegada!

 

Determinação – Lituânia, Junho 2015
Encontrar uma família de bielorrussos, numa estrada cortada na fronteira da Polónia com a Lituânia, e convencê-los a ajudarem um casal de portugueses a desatascar 268 kg de uma BMW GSA que seria preciso carregar em braços. Não há uma língua comum (eles falam russo e nós não), mas é preciso ajuda para sair dali e o carro deles é o único a passar naquele percurso, àquela hora. O resgate da mota é celebrado com um abraço sentido, envolto em lágrimas e uma selfie para a posteridade.

 

Coragem – Marrocos, Maio 2014
Atravessar o Alto Atlas, sem Wi-Fi, sem GPS de navegação, confiando apenas na bússola que indica o norte. Oito horas de navegação, à pendura da já conhecida mota BMW GSA, com as quatro estações a fazerem-se sentir. Ultrapassar carrinhas com fardos de palha, burros, rebanhos, povoações que dão lugar a desertos e a alcatrão esbatido, frequentemente substituído por gravilha comida pela neve. Mas seguir, porque é preciso chegar ao destino programado nesse dia – e dormir ao relento não parece ser melhor alternativa.

 

Optimismo – todas as viagens em família
Entre pais e filhos, somos nove. Viajar com uma tribo de energia infinita. Cumprir horários e programas. Conciliar interesses de diferentes idades, diferentes estilos. E querer repetir, querermos repetir, ano após ano, num processo de descoberta e crescimento em família ímpar.

 

Curiosidade – qualquer mercado, qualquer recanto escondido numa rua do mundo
Conversas perdidas em encontros ocasionais em viagem. Abertura para receber as mais diversas ofertas e os amigos que vou fazendo à volta do mundo.

O percurso assume um carácter meramente didáctico, onde cada momento traz a lição estudada. No final, percebo que cada quilómetro percorrido me ensinou tanto sobre liderança quanto as salas de formação corporativa. A diferença é que, nas estradas do mundo, não há simulações — apenas decisões reais, com consequências reais, tomadas por pessoas reais.

Quando regresso a casa e abro novamente as folhas de Excel para planear a próxima aventura, sei que não estou apenas a organizar hotéis e percursos; estou a desenhar os próximos capítulos da minha formação como líder, sabendo que cada nova viagem me trará desafios que nenhum manual consegue antecipar.

Porque no fim, a liderança não se aprende apenas nos livros – vive-se no dia-a-dia das empresas e das estradas; constrói-se nas pontes que estabelecemos com os outros, e aperfeiçoa-se a cada decisão corajosa que tomamos quando o caminho se torna incerto.

O mundo como campo de treino para a liderança é possível, e entre estradas e estratégias vamos deixando a nossa pegada.


Este artigo foi publicado na edição de Junho (nº. 174) da Human Resources

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